A crescente adoção de sistemas baseados em Inteligência Artificial (IA) está reformulando de forma significativa o mercado de trabalho em todo o mundo.
Atividades antes realizadas por humanos, como atendimento ao cliente, produção de conteúdo, revisão textual e até algumas funções jurídicas, estão sendo substituídas por softwares automatizados que operam com alta precisão e sem vínculo empregatício.
No Brasil, a ausência de regulamentação específica sobre o uso da IA nas relações de trabalho tem gerado preocupação entre juristas e especialistas. O desafio não está em conter o avanço tecnológico, mas em estabelecer limites legais que preservem os direitos dos trabalhadores diante dessa transformação.
Riscos trabalhistas em um ambiente automatizado
Um dos pontos críticos apontados por especialistas é o uso de algoritmos em processos de recrutamento, avaliação de desempenho e desligamento de funcionários. Embora essas práticas tragam eficiência, a responsabilidade por eventuais erros — como discriminações algorítmicas ou decisões imprecisas — recai sobre as empresas.
A legislação brasileira, conforme o entendimento atual, ainda atribui ao empregador os riscos da atividade, mesmo que terceirizados a sistemas automatizados.
Além disso, cresce a preocupação com a obsolescência profissional. A substituição de trabalhadores por máquinas não apenas elimina postos de trabalho, mas também dificulta a reinserção no mercado, especialmente entre pessoas com menor escolaridade. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não impõe obrigações aos empregadores quanto à requalificação de funcionários afetados pela automação.
Legislação atual é considerada insuficiente
Atualmente, a única legislação que aborda parcialmente o tema é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). O artigo 20 da norma assegura o direito à revisão de decisões automatizadas.
No entanto, a LGPD não contempla aspectos específicos do ambiente laboral, como a subordinação a sistemas algorítmicos ou a imposição de metas por mecanismos de monitoramento em tempo real.
Diante desse cenário, especialistas defendem uma atualização da legislação trabalhista que leve em consideração os novos formatos de gestão digital.
A falta de regulamentação pode levar ao aumento da judicialização, com ações envolvendo demissões motivadas por algoritmos, alegações de assédio moral digital e outras consequências da automação desregulada.
Iniciativas em debate
Na Europa, países da União Europeia já avançaram na regulação da IA com legislações como o AI Act, que classifica os riscos associados à Tecnologia e impõe obrigações específicas às empresas.
No Brasil, tramita no Congresso o Projeto de Lei nº 2.338/2023, que institui o Marco Legal da Inteligência Artificial. No entanto, o texto ainda não aborda com profundidade os impactos da IA nas relações de trabalho.
Especialistas alertam que, sem uma legislação clara, o país pode enfrentar um cenário de insegurança jurídica tanto para trabalhadores quanto para empresas.
A regulamentação do uso de IA no ambiente corporativo é vista como um passo essencial para garantir que os avanços tecnológicos respeitem os princípios constitucionais que regem o trabalho no Brasil.