Especialistas do setor de energia alertaram, durante o 3º Seminário Tributação em Óleo e Gás, realizado nesta semana no Rio de Janeiro, que o novo regime monofásico de tributação pode gerar um acúmulo de até R$ 9 bilhões por ano em créditos tributários não recuperáveis no setor de gás natural.
O seminário foi promovido pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) em parceria com a Infis Consultoria.
A estimativa leva em conta a alíquota máxima de 26,5% prevista para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS/CBS), componente da reforma tributária em discussão.
Segundo representantes da indústria, o novo modelo — que centraliza a cobrança de tributos em um único elo da cadeia, geralmente na origem — pode comprometer a competitividade do setor, considerado estratégico para a transição energética no país.
Riscos para investimentos e segurança jurídica
De acordo com especialistas presentes no evento, a aplicação do regime monofásico ignora as especificidades operacionais e comerciais da cadeia do gás natural, dificultando a criação de novos modelos de negócio e o reinvestimento de recursos no setor.
“O imposto se transforma em um custo fixo, gerando distorções como aumento da carga efetiva, perda de competitividade e acúmulo de créditos. Isso não representa uma simplificação real, mas sim uma antecipação da arrecadação”, afirmou Eduardo Pontes, sócio da Infis Consultoria e membro do Conselho Empresarial de Petróleo e Gás da Firjan.
Para Rodrigo Novo, gerente tributário da Origem Energia e coordenador do Comitê Tributário de Gás Natural do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), a falta de clareza na aplicação do regime pode afastar investimentos.
“Sem segurança jurídica e transparência fiscal, o incentivo para investir no gás natural do Brasil se enfraquece”, afirmou.
Contradições com políticas de redução de custos
O modelo tributário em discussão também foi criticado por contrariar iniciativas do Ministério de Minas e Energia (MME) para baratear o preço do gás ao consumidor final.
“O programa Gás para Empregar busca reduzir custos ao longo da cadeia, mas não houve sinalização de redução tributária. Pelo contrário, o regime monofásico deve elevar a carga”, disse Sylvie D’Apote, diretora do IBP.
D’Apote avaliou que há uma incoerência entre as políticas setoriais, com a reforma buscando aumentar a arrecadação enquanto o setor precisa de competitividade para apoiar a reindustrialização e a transição energética.
Gás natural como vetor da segurança energética
A relevância do gás natural na matriz energética brasileira foi destacada ao longo do seminário. Paula Alves, diretora tributária da Eneva, alertou para o risco de desabastecimento de energia elétrica já a partir de 2026.
“Não é possível construir uma nova térmica em menos de quatro ou cinco anos. A energia contratada hoje não será suficiente para atender o país a partir de 2027”, afirmou.
Nesse contexto, o gás natural é apontado como um complemento essencial às fontes renováveis, que têm geração intermitente. Ele também tem papel estratégico na viabilização do biometano, uma fonte renovável com potencial crescente.
Expansão do mercado exige ajustes regulatórios
A diversificação da oferta e a entrada de novos agentes no mercado brasileiro de gás foram citadas como sinais de amadurecimento do setor. Segundo D’Apote, o cenário exige ajustes na regulamentação tributária para que o gás continue sendo um pilar de sustentação da matriz energética.
Anderson Bastos, diretor de estocagem da Origem Energia, reforçou a necessidade de infraestrutura de estocagem, que garanta o equilíbrio entre oferta e demanda.
“No passado, a Petrobras assumia toda a gestão de risco. Hoje, com vários agentes atuando, é fundamental ter mecanismos que garantam o balanceamento do sistema”, afirmou.
Setor pede ambiente mais favorável a investimentos
O evento encerrou-se com o consenso de que o setor de gás natural precisa de um ambiente regulatório e tributário mais estável e compatível com seus desafios atuais.
Especialistas defendem que a legislação em discussão leve em consideração as peculiaridades da cadeia produtiva, de forma a evitar desincentivos ao investimento e preservar a competitividade do setor.