Setor enfrenta queda na adoção de softwares de gestão e demonstra resistência à transformação digital, segundo estudos recentes.
O Agronegócio brasileiro, um dos principais pilares da economia nacional, enfrenta um cenário contraditório: enquanto avançam os conceitos de digitalização e inovação agrícola — com iniciativas conhecidas como Agro 5.0 e 6.0 — os investimentos em tecnologia no campo mostram sinais de retração.
De acordo com o Índice Agrotech, divulgado pela GS1 Brasil (Associação Brasileira de Automação), o uso de softwares comerciais para a gestão agropecuária caiu de 38% em 2021 para 20% em 2024. A adoção de soluções desenvolvidas pelas próprias empresas também recuou, passando de 24% para 20% no mesmo período. De forma geral, o uso de tecnologias para gestão de lavouras e pastagens apresentou queda de 12% entre 2021 e 2023.
Desaceleração no índice de digitalização
O índice, que varia de 0 (ausência total de digitalização) a 1 (digitalização completa), subiu de 0,155 em 2019 para 0,206 em 2021, mas apresentou leve queda para 0,205 em 2023. Outro dado preocupante do levantamento é o aumento no número de agricultores que abandonaram o gerenciamento sistematizado da produção, que passou de 6% em 2021 para 12% em 2024.
Resistência à transformação digital
Estudos apontam que a resistência à adoção de novas tecnologias pode estar relacionada a fatores culturais e estruturais.
O Índice Transformação Digital Brasil (ITDBr) 2024, elaborado pela PwC Brasil, revelou que o agronegócio possui o menor índice de maturidade digital entre todos os setores da economia, com nota média de 3,1, inferior à média geral de 3,7.
O levantamento da PwC também mostrou que 75,8% das empresas do setor adotam uma abordagem seletiva para investimentos em tecnologia, bem acima da média de 46,3% observada nos demais setores.
Apenas 21,2% das empresas do agronegócio consideram a transformação digital parte fundamental de seus investimentos, contra 40,3% da média geral.
Entraves organizacionais
A estrutura organizacional e a cultura interna das empresas do agro são apontadas como os principais entraves à digitalização. Para 73% das empresas do setor, esses fatores dificultam a implementação de tecnologias, em comparação a 49% nos demais segmentos da economia.
Apesar das dificuldades, o setor mostra avanços no que se refere à sustentabilidade, bandeira central do conceito de Agro 6.0. O Índice Agrotech registrou crescimento de 19% nesse aspecto entre 2021 e 2023. O indicador ambiental passou de 0,225 em 2019 para 0,310 em 2023.
A evolução tecnológica no campo
A história do agronegócio brasileiro é marcada por uma série de transformações tecnológicas:
- Agro 1.0: fase inicial, com técnicas rudimentares, baixa mecanização e agricultura de subsistência.
- Agro 2.0: introdução da mecanização, fertilizantes e defensivos na década de 1950, associada à Revolução Verde.
- Agro 3.0: início da automação e preocupação com sustentabilidade, com coleta e análise de dados para tomada de decisões.
- Agro 4.0: consolidação da agricultura de precisão com GPS, sensores e imagens por satélite.
- Agro 5.0: uso de inteligência artificial, robótica, IoT, sistemas autônomos e análise avançada de dados.
- Agro 6.0: foco na bioeconomia, circularidade produtiva, biotecnologia e redução de impactos ambientais.
Desafios e perspectivas
A discrepância entre os avanços tecnológicos disponíveis e sua real aplicação no campo brasileiro aponta para a necessidade de políticas públicas, incentivos e capacitação que promovam uma verdadeira transformação digital no setor.
Especialistas alertam que, sem uma estratégia robusta, o agronegócio corre o risco de perder competitividade diante das exigências do mercado global.