As recentes demissões em larga escala no setor financeiro, motivadas por acusações de fraude em registros de ponto, trouxeram à tona um tema que vem ganhando relevância no ambiente de trabalho: até onde vai a responsabilidade das empresas no controle da jornada de empregados em regime remoto e qual é o limite entre monitoramento legítimo e invasão de privacidade?
O sindicato da categoria alegou a adoção de métodos de vigilância considerados abusivos, enquanto a instituição envolvida justificou a medida como necessária para preservar a segurança de suas operações.
O episódio reaquece a discussão sobre como equilibrar produtividade, compliance, proteção de dados e respeito à intimidade em tempos de home office e trabalho híbrido.
Ferramentas de monitoramento e riscos à privacidade
Nos últimos anos, organizações de diferentes setores passaram a investir em soluções de Mobile Device Management (MDM) para gerenciar equipamentos corporativos como celulares, tablets e notebooks.
Essas ferramentas permitem restringir aplicativos, definir rotinas de uso, bloquear funções durante deslocamentos e até rastrear geolocalização dos dispositivos.
A lógica é prevenir vazamentos de informações estratégicas, que podem ocorrer até por meios simples, como o envio de capturas de tela em aplicativos de mensagens. Contudo, o uso desses sistemas levanta preocupações sobre os impactos na privacidade dos trabalhadores.
LGPD e a necessidade de transparência
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor desde 2020, estabelece que empresas precisam justificar a coleta de dados e informar de forma clara como serão utilizados. No caso de monitoramento, a prática deve ocorrer somente com consentimento expresso do colaborador.
Apesar disso, a legislação ainda apresenta brechas interpretativas, utilizando termos amplos como “medidas adequadas”. Essa subjetividade gera insegurança jurídica tanto para empregadores quanto para empregados.
Um estudo da Logicalis apontou que, em 2023, apenas 36% das médias empresas estavam totalmente adequadas às exigências da LGPD.
Além da adaptação inicial, a manutenção da conformidade exige investimentos constantes em processos e Tecnologia, o que tem gerado pedidos para que a legislação avance em parâmetros mais objetivos e incentive práticas de segurança, como certificações internacionais.
Um desafio em transição
O dilema atual reflete transformações no mundo do trabalho. Enquanto as empresas buscam eficiência e proteção de dados, os trabalhadores reivindicam confiança e autonomia.
O desafio, segundo especialistas, é construir modelos em que a tecnologia seja uma ferramenta de compliance sem se tornar instrumento de vigilância excessiva.
As demissões em massa expuseram tensões, mas também abriram espaço para amadurecer o debate sobre governança digital, proteção de dados e direitos trabalhistas em regimes de home office e trabalho híbrido.