O Parlamento do Japão elegeu nesta terça-feira (21) a conservadora Sanae Takaichi, de 64 anos, como primeira-ministra, tornando-se a primeira mulher da história japonesa a ocupar o cargo. A líder do Partido Liberal Democrata (PLD) foi confirmada após vencer uma eleição interna acirrada contra veteranos do partido — todos homens — e conquistar 237 votos na Câmara Baixa, superando a maioria dos 465 assentos.
Sua eleição encerra um período de instabilidade política e consolida mais de sete décadas de domínio do PLD sobre o governo japonês, mesmo diante da recente perda de popularidade da sigla.
Linha-dura e admiradora de Thatcher
Conhecida por seu perfil nacionalista e linha-dura, Takaichi simboliza o fortalecimento da ala mais conservadora dentro do partido. Durante a campanha, declarou o desejo de se tornar a “dama de ferro do Japão”, em referência à ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, de quem é admiradora assumida.
“Pretendo liderar com coragem, estabilidade e responsabilidade. O Japão precisa de firmeza e visão estratégica para enfrentar os novos tempos”, afirmou após a votação.
Além da política, Takaichi é conhecida por seu lado peculiar: ex-baterista de uma banda de heavy metal, é fã de grupos como Iron Maiden e Deep Purple, e mantém uma imagem pública que mistura disciplina, conservadorismo e ousadia cultural.
Desafios no comando
A nova premiê assume o país em um momento de fragilidade econômica, envelhecimento populacional e crescimento do número de imigrantes — tema sensível na sociedade japonesa. Em discursos recentes, Takaichi defendeu cautela com políticas migratórias, afirmando que uma “imigração precipitada” poderia gerar tensões sociais.
“Precisamos garantir que o Japão continue um lugar pacífico e harmonioso, onde cidadãos e estrangeiros possam viver com respeito mútuo”, afirmou.
No campo econômico, Takaichi propõe uma agenda fiscal expansionista, com investimentos estatais em ciência, Tecnologia, infraestrutura e segurança alimentar. Embora mantenha postura conservadora em temas sociais, sua política econômica é mais intervencionista, com tolerância ao endividamento controlado para reaquecer o crescimento e enfrentar o alto custo de vida.
Gênero e política
Apesar do discurso de modernização, Takaichi mantém posições tradicionalistas em temas de gênero. Ela já se opôs a reformas que ampliem os direitos das mulheres, rejeita o casamento entre pessoas do mesmo sexo e defende a manutenção da lei que obriga casais a adotar o mesmo sobrenome após o matrimônio.
Mesmo assim, prometeu garantir paridade de gênero nos cargos de liderança do governo e do partido:
“O Japão precisa de mais mulheres nas esferas de decisão. Trabalharemos para alcançar uma proporção comparável à dos países nórdicos”, declarou.
A ascensão de Takaichi tem duplo significado: é um marco histórico de representação feminina, mas também um sinal de reafirmação conservadora em um cenário político em transformação.
Cenário político e coalizão
A vitória de Takaichi ocorre após a renúncia do ex-premiê Shigeru Ishiba, pressionado por derrotas eleitorais consecutivas que enfraqueceram o PLD. Em julho, o partido perdeu a maioria na Câmara Alta — uma das piores derrotas em 70 anos. Em outubro do ano passado, também se tornou minoritário na Câmara Baixa.
Para garantir a maioria parlamentar e viabilizar sua eleição, o PLD formou uma coalizão com o Partido da Inovação (Ishin) após o rompimento com o partido Komeito, envolvido em escândalos financeiros. O acordo foi decisivo para consolidar a vitória de Takaichi e restaurar a estabilidade política em meio à crise.
Um novo capítulo na história japonesa
A chegada de Sanae Takaichi ao comando do Japão representa um momento de inflexão: uma liderança feminina e ultraconservadora à frente de uma das nações mais tradicionais do mundo. Sua gestão testará o equilíbrio entre modernização econômica e preservação de valores culturais, além de redefinir o papel do Japão no cenário geopolítico asiático.