A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (cop30) teve início nesta segunda-feira (10), na capital paraense, sob altas expectativas de que o Brasil lidere uma nova fase de compromissos globais pelo clima. No entanto, enquanto o país anfitrião busca projetar uma imagem de liderança ambiental, decisões recentes em Brasília têm despertado críticas e colocado em dúvida a coerência de sua política doméstica com os objetivos da cúpula.
De acordo com apuração do Portal Internacional Mongabay, três medidas anunciadas nas últimas semanas estão no centro das controvérsias:
- a autorização para perfuração exploratória de petróleo na costa amazônica,
- o fim da Moratória da Soja, e
- a proposta de flexibilização do licenciamento ambiental.
Especialistas ouvidos pelo portal alertam que essas iniciativas “podem colocar em risco a credibilidade global do país” e diluir os resultados da COP30, reduzindo-os a promessas vagas e linguagem diplomática branda.
Tensões entre ambição climática e decisões domésticas
Menos de um mês antes da cúpula, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu a primeira licença de exploração de petróleo próximo à foz do rio Amazonas — uma das regiões marinhas mais biodiversas do planeta. O projeto, liderado pela Petrobras, enfrentou oposição de comunidades locais e ambientalistas, que alertam para os riscos de vazamentos em uma área sensível.
Em agosto, o fim da Moratória da Soja, um pacto que desde 2006 impedia a compra de soja produzida em áreas desmatadas da Amazônia, também gerou reação internacional. A decisão, justificada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sob o argumento de livre concorrência, foi suspensa temporariamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas a pressão do agronegócio persiste.
Paralelamente, o Congresso discute o chamado “projeto de lei da devastação”, que propõe acelerar processos de licenciamento ambiental e reduzir exigências para obras de infraestrutura. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou parcialmente o texto, mas líderes parlamentares indicam que podem reverter as restrições.
“O Brasil precisa de consistência entre o que faz em casa e o que defende no exterior”, declarou à Mongabay Jasper Inventor, vice-diretor do Greenpeace Internacional.
“As palavras de liderança climática precisam ser acompanhadas de ação real.”
Contradições globais e risco de estagnação
A reportagem da Mongabay observa que o Brasil não está sozinho em suas contradições. Noruega, Austrália e China também avançaram recentemente em novos projetos de combustíveis fósseis.
Para Kathryn Hochstetler, professora da London School of Economics, isso cria um ambiente em que os países “evitam responsabilizar uns aos outros porque todos enfrentam dilemas semelhantes”.
“Meu grande medo é que esta COP resulte em metas menos ambiciosas e cronogramas mais frouxos para a transição energética”, disse à publicação.
A pressão geopolítica e a busca por segurança energética, agravadas pela guerra na Ucrânia e pela volatilidade global, têm levado muitos governos a priorizar ganhos econômicos imediatos sobre metas climáticas de longo prazo.
Entre avanços e retrocessos
Apesar das críticas, o Brasil chega à COP30 com sinais positivos, como a redução nas taxas de desmatamento e o anúncio do Tropical Forest Forever Facility (TFFF) — um fundo de US$ 5 bilhões voltado à proteção florestal.
Em seu discurso na abertura da conferência, Lula defendeu que “é hora de enfrentar a realidade das mudanças climáticas” e pediu ações concretas.
Ainda assim, analistas apontam que o sucesso da presidência brasileira da COP dependerá de como o país conciliará discurso e prática nas próximas semanas.
“Palavras fortes precisam de ações fortes”, alertou Jasper Inventor, do Greenpeace. “A liderança climática do Brasil só será legítima se vier acompanhada de transparência e coerência.”
Fontes:
Mongabay: “Brazil hosts COP30 with high ambitions — and scaling environmental ambiguities” (10/11/2025)






















