A promessa de que a inteligência artificial (IA) revolucionaria o recrutamento de executivos ganhou força nos últimos anos. Algoritmos capazes de triar milhares de currículos, cruzar dados de performance e prever aderência cultural se tornaram soluções atraentes para empresas em busca de eficiência.
Contudo, à medida que essas ferramentas se disseminam, crescem as preocupações quanto à possibilidade de comprometerem a diversidade e a equidade que muitas companhias buscam promover.
De acordo com levantamento global da consultoria Korn Ferry, 40% dos profissionais de Recursos Humanos temem que a IA perpetue padrões ultrapassados de decisão, por ser treinada com dados históricos que podem refletir vieses inconscientes e estruturas excludentes. No Brasil, esse risco se intensifica diante de um cenário marcado por desigualdades estruturais e diversidade racial, social e educacional.
Potencial e riscos da IA em processos seletivos
Especialistas destacam que o uso da IA não é, em si, um problema. A Tecnologia pode tornar etapas operacionais mais ágeis e apoiar a tomada de decisões com base em dados objetivos.
O risco, no entanto, está em utilizá-la como substituta do julgamento humano — especialmente na seleção de líderes, cujas competências exigem avaliação subjetiva e contextual.
Empresas brasileiras de setores como financeiro, industrial e de tecnologia têm adotado medidas para mitigar esses riscos. Iniciativas incluem auditorias de viés algorítmico, capacitação de equipes de RH para leitura crítica dos resultados e revisão das bases de dados utilizadas nos modelos.
Segundo o relatório The Talent Shift, da Korn Ferry, características como empatia, adaptabilidade e visão estratégica seguem como fatores determinantes para o sucesso em cargos de liderança — e ainda não são plenamente mensuráveis por sistemas automatizados.
Automatização de erros e impacto estratégico
A adoção acrítica de soluções algorítmicas pode levar à “automatização do erro”, isto é, à tomada de decisões enviesadas com maior rapidez e menos visibilidade.
Em um ambiente como o brasileiro, essa prática pode comprometer não apenas os resultados operacionais, mas também a reputação corporativa e a aderência a princípios ESG (ambientais, sociais e de governança).
A recomendação da Korn Ferry é clara: o uso da IA deve ser acompanhado por governança ética e protagonismo humano nas decisões-chave. A tecnologia deve ser vista como aliada, e não como substituta da análise executiva.
Papel da liderança e governança ética
A responsabilidade sobre o uso ético da IA no recrutamento não pode recair apenas sobre áreas técnicas. Conselhos de administração e lideranças executivas devem participar ativamente das discussões e definir parâmetros claros sobre os limites do uso desses recursos.
Estudos apontam que equipes diversas superam em até 30% aquelas com baixa diversidade em indicadores de desempenho e engajamento. Essa vantagem competitiva começa já na forma como os talentos são identificados e contratados.
Embora a IA represente um avanço significativo nos processos seletivos, seu impacto final dependerá da maneira como é aplicada.
Em países com desafios estruturais de inclusão, como o Brasil, o uso da tecnologia exige reflexão crítica e alinhamento entre valores e práticas organizacionais. Afinal, ainda é o fator humano que determina o rumo das decisões.