Na última semana, os Estados Unidos registraram 228 mil novos pedidos de auxílio-desemprego, número abaixo das expectativas do mercado, que estimavam 230 mil solicitações.
O dado reforça a percepção de resiliência no mercado de trabalho americano, mesmo diante do cenário de juros elevados e incertezas econômicas globais.
Segundo analistas, a queda nos pedidos de seguro-desemprego é um sinal de que os empregadores continuam relutantes em demitir funcionários, comportamento atribuído à escassez de mão de obra vivida nos anos pós-pandemia.
Essa cautela das empresas ajuda a sustentar o consumo interno, o que, por sua vez, mantém a atividade econômica em níveis relativamente estáveis.
Leitura positiva, mas com ressalvas
Especialistas ponderam, no entanto, que a leitura do dado não pode ser isolada do contexto macroeconômico atual. A combinação de juros altos, inflação persistente e tensões comerciais, especialmente com a China, são fatores que impõem riscos à sustentabilidade do atual nível de emprego.
Para Pedro Ros, CEO da Referência Capital, a economia americana ainda resiste, mas “o fio é tênue”, e a confiança empresarial já começa a mostrar sinais de estresse. “O Fed ganha tempo, mas não pode ignorar os riscos”, afirma.
A avaliação é compartilhada por Jorge Kotz, CEO do Grupo X, que destaca a surpresa positiva do dado, mas ressalta que ele reduz a urgência por cortes de juros, o que mantém o dólar em patamar elevado. “Isso tem efeitos importantes para mercados emergentes como o Brasil”, diz.
Com a taxa de juros mantida entre 4,25% e 4,50%, o Federal Reserve (Fed) tem adotado postura cautelosa diante da inflação e das perspectivas de crescimento. Embora o dado recente de emprego alivie, em parte, as preocupações com o mercado de trabalho, a autoridade monetária norte-americana segue atenta a possíveis deteriorações.
Segundo Felipe Uchida, da Equus Capital, “o mercado permanece em estado de alerta quanto aos impactos futuros nos dados de emprego e inflação”.
Impacto no cenário global e brasileiro
O fortalecimento do dólar como consequência da manutenção de juros elevados nos EUA tem implicações diretas para economias emergentes, como o Brasil. Para Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, “o diferencial de juros precisa continuar alto para atrair capital estrangeiro”.
Isso pressiona o Banco Central brasileiro a manter taxas elevadas, o que encarece o crédito e dificulta a retomada do crescimento interno.
Volnei Eyng, da Multiplike, reforça que o número de pedidos de auxílio-desemprego fortalece a confiança dos investidores nos EUA, especialmente em ações de grandes empresas de Tecnologia, mas também adia uma possível flexibilização da política monetária. “Isso mantém o dólar valorizado e tem efeito direto sobre as importações brasileiras”, afirma.
Empresas resistem a demitir, mas incertezas persistem
Vários analistas atribuem a resiliência atual do mercado de trabalho a uma espécie de inércia empresarial. Após anos de escassez de mão de obra, empresas demonstram resistência em realizar cortes. Para Sidney Lima, da Ouro Preto Investimentos, essa resistência pode ser temporária.
“As tarifas comerciais, especialmente as impostas durante o governo Trump, começam a afetar a confiança dos empresários e consumidores. A deterioração pode aparecer nos próximos indicadores.”
A cautela é compartilhada por João Kepler, do Equity Group. “Há algo de enganoso na leitura do número. A rigidez nas demissões pode ser um último suspiro antes de uma onda de ajustes”, avalia.
Embora o dado de 228 mil pedidos traga certo alívio ao mercado, o consenso entre especialistas é de que o cenário segue frágil e sujeito a mudanças rápidas. “A robustez do consumo ajuda no curto prazo, mas adia cortes de juros, o que pressiona o custo do capital