A recente decisão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), que impediu a retomada de pivôs de irrigação utilizados por uma empresa rural em recuperação judicial, ampliou o debate jurídico sobre o conceito de bem essencial e os limites de atuação dos credores no agronegócio. O caso traz implicações relevantes para renegociações de dívidas e para a preservação da atividade produtiva no campo.
Papel estratégico dos equipamentos agrícolas
Segundo o advogado André Aidar, sócio e head de Direito do Agronegócio no Lara Martins Advogados, a decisão representa uma mudança de paradigma no setor.
“A essencialidade não depende do tamanho ou do valor do bem, mas do seu papel estratégico dentro da produção. Mesmo representando menos de 1% da área, os pivôs eram vitais para manter a produtividade e a continuidade da atividade”, explica.
Para o especialista, a medida reforça a aplicação do princípio da preservação da empresa rural e da função social da propriedade. Ele destaca que certos equipamentos são indispensáveis à operação agrícola e que a sua retirada pode comprometer toda a cadeia produtiva.
Fortalecimento da posição do produtor nas renegociações
A interpretação adotada pelo tribunal também vem sendo observada em renegociações de dívidas rurais. O advogado Adhemar Michelin Filho, sócio da Michelin Sociedade de Advogados, aponta que a jurisprudência recente tem fortalecido a posição do produtor rural nas disputas com instituições financeiras.
“O Judiciário está mais atento à disparidade de forças entre produtor e instituição financeira. Tribunais têm reconhecido a vulnerabilidade do contratante e aplicado o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de crédito rural, o que obriga os bancos a serem mais transparentes e diligentes”, afirma.
Impacto de decisões e súmulas sobre crédito rural
Adhemar também destaca a relevância da Súmula 298 do STJ, que consolidou o direito à prorrogação de dívidas rurais, além da tese da quitação pelo seguro agrícola. Nessa interpretação, se a instituição financeira deixa de acionar a seguradora após a perda da lavoura, a execução da dívida pode ser extinta.
“Quando o banco falha em acionar o seguro, a dívida perde o atributo da exigibilidade. Essa responsabilização tem levado as instituições financeiras a reavaliarem suas condutas e permitido renegociações mais justas”, explica o advogado.
Tendência de modernização no crédito rural
Para os especialistas, a decisão do TJ-GO reflete uma tendência mais ampla de modernização da interpretação do crédito rural no país. O foco passa a considerar não apenas os contratos formais, mas também a função social da propriedade e a Sustentabilidade produtiva do campo — fatores que podem influenciar diretamente o equilíbrio nas relações entre produtores e credores.