Agricultores de estados como Bahia, Sergipe e São Paulo enfrentam um paradoxo nesta safra: produção em alta, mas preços em queda livre. O excesso de oferta e a incapacidade da indústria de processar toda a fruta estão levando produtores a amargar prejuízos – e até a descartar laranjas nos pomares e nos caminhões.
Produção recorde em Sergipe e São Paulo
Em Sergipe, produtores relatam uma das melhores safras já registradas. A expectativa é colher até 900 toneladas por pomar até outubro. No ano passado, o estado colheu mais de 380 mil toneladas e, em 2025, a projeção é superar 420 mil toneladas, segundo especialistas.
Em São Paulo, maior polo citrícola do país, a safra também é farta, apesar de problemas recentes com o greening, principal doença da laranja, que reduziu a produção em 25% em 2024. No interior paulista, uma fazenda com 600 mil árvores prevê colher entre 700 e 800 toneladas nesta temporada, segundo relato ao portal G1.
Gargalo na indústria e perdas crescentes
A abundância de frutas contrasta com a falta de capacidade industrial para processar toda a produção. Caminhões chegam a esperar quatro dias nas filas das fábricas, o que acelera o apodrecimento da fruta.
“Eu perdi uma carga de laranja, apodreceu em cima do carro, joguei no mato. Carreguei na sexta-feira e só descarreguei na terça”, contou o agricultor Josesandro dos Santos ao Globo Rural.
O empresário Raelmo de Melo, sócio da processadora Top Fruit, reconheceu o problema: “Tivemos uma paralisação e há uma fila de 200 caminhões na porta da fábrica. Precisamos resolver o quanto antes”, disse em nota ao Estadão.
Para o secretário da Agricultura de Sergipe, Zeca Ramos, a crise passa não apenas pelo excesso de fruta, mas também pela falta de escalonamento na colheita e pelas exigências de qualidade do mercado internacional, que dificultam o fluxo das exportações.
Preços em colapso
Além do gargalo logístico, o preço pago pela laranja despencou. Em 2024, a tonelada chegou a R$ 2.100. Este ano, não passa de R$ 600.
O custo de produção, somado ao frete, gira em torno de R$ 800 por tonelada – o que torna a colheita inviável para muitos agricultores. O resultado é a perda de cargas inteiras, abandonadas nos pomares ou em caminhões, com prejuízos crescentes.
Tarifaço de Trump e incertezas no setor
Segundo o Cepea/Esalq-USP, os contratos da safra 2025/26 seguem em ritmo lento, em parte devido às incertezas geradas pelo tarifaço dos EUA.
Embora o suco de laranja tenha ficado de fora da sobretaxa de 40%, subprodutos fundamentais da cadeia cítrica – como óleos essenciais e células cítricas (utilizadas na indústria de alimentos e cosméticos) – continuam sendo taxados em 50%.
Esse fator aumenta os custos e reduz a competitividade da laranja brasileira em mercados internacionais, ampliando a apreensão dos exportadores.
Menor volume, maior receita
O Brasil fechou a safra 2024/25 com o menor volume exportado de suco de laranja em quase 30 anos. No entanto, a receita foi recorde, alcançando US$ 3,48 bilhões, um crescimento de 28,4% em relação à safra anterior, de acordo com o Cepea.
Esse aparente contraste se explica pelo aumento dos preços internacionais, mas especialistas alertam: o futuro do setor permanece incerto diante das barreiras comerciais e da instabilidade política entre Brasil e Estados Unidos.
A modernização no campo, com maior investimento em adubação, controle de pragas e novas mudas, tornou os pomares mais produtivos. Porém, sem que a infraestrutura industrial acompanhasse esse ritmo, os agricultores enfrentam hoje um cenário de produção elevada, preços baixos e falta de escoamento.
Se por um lado a safra é considerada “histórica”, por outro, a situação evidencia a vulnerabilidade de um setor que depende não apenas do clima, mas também da capacidade de absorção industrial e da logística para garantir que a fruta chegue ao mercado antes de apodrecer.
Em resumo: o Brasil colhe uma das maiores safras de laranja dos últimos anos, mas enfrenta uma crise de escoamento e preços, deixando produtores com prejuízos e toneladas de fruta perdida no campo.