Em sua origem, “start-up” é palavra da língua inglesa que designa o “Ato ou processo de iniciar uma operação ou movimento” (American Heritage Dictionary of the English Language, 2011) e, segundo Markos Wonder (2015), remontar-se-ia ao ano de 1550.
Todavia, no contexto empresarial, com o sentido de empresa iniciante, parece que o vocábulo “start-up” foi utilizado pela primeira vez em um artigo publicado pela revista Forbes em agosto de 1976 e, no ano seguinte, outro famoso periódico americano, a revista Business Week, registrou que “An incubator for startup companies, especially in the fast-growth, high-technology fields” (Lebret, 2012).
Mas foi somente após a criação da Internet em meados da década de 90, e a vertiginosa expansão da tecnologia da informação que se verificou desde então, é que o termo “start-up” começou a ser amplamente utilizado, sempre se referindo a negócios recém-constituídos, geralmente utilizando-se da Internet e da tecnologia da informação, com baixo custo de implantação e manutenção, elevado grau de incerteza de sucesso, mas com alto potencial de escalabilidade , capazes de atingirem um rápido crescimento com base na oferta de produtos ou serviços inovadores aos olhos do mercado (Reis, 2018).
Com efeito, segundo a definição tão célebre quanto concisa de Eric Ries, “Uma ‘start-up’ é uma organização humana projetada para criar novos produtos e serviços sob condições de extrema incerteza” (2019). Portanto, as características essenciais da “start-up” são a “Inovação disruptiva” – na expressiva locução cunhada por Clayton Christensen e Joseph Bower (1995) – e a extrema incerteza. A “start-up” trabalha num campo de altíssimo risco mercadológico. É o que a diferencia, fundamentalmente, das empresas tradicionais, pequenas ou grandes. E isso decorre de seu caráter inovador: o empreendedor de uma “start-up” muitas vezes introduz no mercado algo radicalmente novo, mas sem qualquer garantia prévia ou probabilidade de que a novidade será assimilada (Feigelson et. al., 2019).
E o troféu perseguido pelo fundador da “start-up” ao decidir dar forma empresarial a uma inovação disruptiva em ambiente de extrema incerteza é a escalabilidade. Geralmente, o produto concebido e comercializado por uma “start-up” é replicável e escalável graças ao emprego intensivo de tecnologia, eis que passível de ser reproduzido e comercializado em larga escala, sem custos adicionais significativos, em perfeita economia de escala, podendo render à “start-up” um salto de faturamento gigantesco. Pense-se, por exemplo, em um software.
São emblemáticos, nesse aspecto, os “cases” do Google e da Amazon, dentre outros, cujos respectivos valores de mercado, há pouco mais de dois anos de terem nascido como “start-ups”, quadruplicaram quando abriram o capital por meio da primeira oferta ao público de ações de sua emissão.
“Start-ups” como essas vieram a receber posteriormente a sugestiva alcunha de “Unicórnios”, lançada por Aileen Lee, célebre investidora em “Venture Capital” do não menos icônico ecossistema do Vale do Silício, na Califórnia, EUA, em artigo intitulado “Bem-vindo ao clube dos unicórnios: Aprendendo com ‘start-ups’ de um bilhão de dólares”, em alusão às empresas que alcançaram, em menos de dois anos de sua criação, um valor de mercado superior a um bilhão de dólares – algo raro como a figura mitológica do unicórnio.
A compreensão da idiossincrasia ínsita à “start-up” deveria levar os advogados e consultores dos valentes empreendedores a se conscientizarem de que os arranjos tradicionais do Direito Societário nem sempre se prestam a conferir a devida segurança jurídica a seus negócios diferenciados. Um empreendimento portador de inovação disruptiva induz riscos bem maiores que os habitualmente aceitos pelas empresas tradicionais, dada a incerteza mercadológica do produto. Daí a importância de se adequar as soluções contratuais tradicionais às peculiaridades do modelo de negócio característico da “start-up”, de modo a torná-las aptas a contemplar os interesses tanto do empreendedor quanto dos investidores que nele acreditam (Feigelson et. al., 2019).
Nesse sentido, Alison Weinberg e Jamie Heine sustentam que, para serem valorizados no ecossistema altamente tecnológico das “start-ups”, os advogados deveriam ser mais do que meros consultores jurídicos: têm que aprender a identificar as características essenciais e necessidades dos negócios de seus clientes, para em seguida incluí-las nas soluções jurídicas que lhes apresentam. Os advogados não deveriam pensar apenas em termos legais, mas também, e sobretudo, sob a ótica negocial, é dizer, têm de compreender a fundo o negócio objetivado pela “start-up”, até para melhor discernir, num segundo momento, as suas dimensões jurídicas.
Jack Wrolsden, por sua vez, afirma que o papel dos consultores jurídicos é bem maior que a mera atuação em questões pontuais. Advogados especializados em negócios disruptivos – os “disruptive framers” (balizadores da disrupção) – são responsáveis por contornar problemas e desenvolver estratégias jurídicas para os empreendedores no contexto da “Destruição criadora” há muito identificada e propugnada por Joseph Alois Schumpeter (1939). Não basta aos advogados possuírem especializações pontuais em determinados assuntos jurídicos, mas é necessário também que alcancem a perfeita compreensão da realidade negocial inovadora inerente à “start-up” (Wrolsden, 2016).
*Roberto Braga é advogado e sócio da Braga de Andrade Advogados. É doutor em Direito Civil pela USP e atua em proteção de dados pessoais; consultoria contratual e societária. É professor do curso de especialização no Insper sobre a LGPD.