O setor de varejo brasileiro tem enfrentado uma série de desafios nos últimos anos, impulsionados por fatores como a pandemia da COVID-19, a digitalização acelerada e a mudança nas preferências dos consumidores.
Além disso, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (2023), 78,3% das famílias brasileiras estão endividadas, o que leva à maior inadimplência e dificuldades de acesso ao crédito, dentre outros fatores.
Recentemente, o IBGE divulgou outro dado: o consumo nos lares, que costuma ser visto como o principal indicador do PIB, cresceu apenas 0,2% no primeiro trimestre, na comparação com o quarto trimestre de 2022.
Além dos problemas financeiros e de gestão interna, a concorrência externa de sites estrangeiros, que não têm custos com loja física, equipe de atendimento, ponto de venda, aluguel, impostos, dentre outros, tem levado algumas das principais varejistas nacionais a enfrentar novos impactos.
Seu efeito cascata pode afetar também outros segmentos, como shoppings e fundos imobiliários, que lidam com a inadimplência dos aluguéis e a queda na demanda.
Isso tudo acaba impactando tanto a confiança dos investidores quanto a disponibilidade e o custo do crédito.
No início deste ano, uma das cinco maiores varejistas brasileiras entrou com um pedido de recuperação judicial, com uma dívida de cerca de R$ 43 bilhões, envolvendo mais de 16 mil credores.
Outra renomada rede de varejo de móveis e decoração do país tem uma dívida estimada em R$ 600 milhões, está fechando lojas e teve a falência solicitada por um credor nos tribunais.
Diante deste cenário e antes de atirarmos pedras no governo, na pandemia ou na falta de crédito, devemos, primeiramente, fazer uma reflexão e questionar se a situação atual não traz oportunidades para as organizações quanto a sua estratégia de valor e modelo de negócio, alguns fatores talvez estejam latentes e iriam acontecer mais cedo ou mais tarde.
É preciso entender que parte do problema ou da solução está dentro da própria empresa e não apenas atribuir responsabilidades externas e contextos de mercado.
Na verdade, o modelo operacional utilizado por muitos negócios não é mais suficiente para enfrentar os desafios atuais, em um cenário que demanda constantes mudanças e inovações.
Neste sentido, a falta de um planejamento bem estruturado e conectado à realidade do modelo de negócio é, sem dúvida, uma das causas mais significativas para o panorama que estamos vivendo.
Em muitos casos, o que acontece é que donos de negócios enfrentam problemas porque não conseguem alinhar a sua estratégia com a realidade da dinâmica do mercado.
Tampouco estruturar sua empresa de acordo com as necessidades dos clientes, fornecedores e demais stakeholders.
O planejamento estratégico é uma ferramenta de gestão indispensável para o desenvolvimento das organizações.
Nele estão descritos os objetivos principais da empresa, metas e o caminho a ser percorrido para alcançá-las.
Além disso, aponta ainda a missão, a visão e os valores da companhia, promovendo integração e alinhamento do time.
Muitos empresários elaboram um planejamento de excelência, mas falham ao colocarem em prática. É fundamental compreender que o mercado está sujeito a diversas variáveis que podem impactar o varejo, mas é preciso fazer o dever de casa, planejar e executar o plano.
E a metodologia baseada em quatro passos é uma ferramenta indispensável para a elaboração das estratégias, onde na etapa de Conceituação há a compreensão dos objetivos macro do negócio.
Os potenciais caminhos estratégicos são definidos na fase de Fundamentação e durante o Planejamento são definidas prioridades, KPIs que serão monitorados e demais necessidades.
Por fim, é no estágio de detalhamento que acontecem o desdobramento dos planos tático e operacional, e a modelagem financeira do negócio.
Empresas como o Mercado Livre, por exemplo, souberam se adaptar à pandemia, agregando serviços e modificando seu modelo de operação, como a aquisição de avião para otimizar sua distribuição.
É fundamental entender a estratégia adequada para cada modelo de negócio, identificar as oportunidades e estabelecer um plano de voo viável, com um modelo operacional adequado para superar a crise e enfrentar os desafios do mercado atual.
Sem dúvida, as perspectivas para o setor varejista brasileiro sugerem uma contínua transformação e adaptação. Aqueles que conseguirem se ajustar às tendências digitais, incorporar a responsabilidade social e responder efetivamente às mudanças nas preferências dos clientes terão mais chances de prosperar.
O futuro será moldado pela capacidade de planejamento para se adaptar às tendências emergentes e aos novos comportamentos dos consumidores.
O cenário atual no setor é um alerta para todas as empresas de varejo, independentemente de seu porte e segmento.
É necessário olhar para dentro, tomar medidas prévias para enfrentar os desafios, buscar adaptação às transformações do mercado e garantir a sustentabilidade do negócio no longo prazo.
Além de uma gestão financeira sólida e estratégias que priorizem a satisfação do público-alvo.
Rogerio Vargas é Engenheiro pela PUC e sócio da Auddas