No início de julho, a primeira fase da Reforma Tributária (Proposta de Emenda à Constituição 45/2029) foi aprovada na Câmara dos Deputados e seguiu para o Senado, onde precisa passar por dois turnos de aprovação (o que deve acontecer em agosto).
A principal proposta da Reforma é a extinção de cinco tributos: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Eles seriam substituídos por apenas um, o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA). A cobrança do IVA seria feita por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que vai substituir o IPI, PIS e Cofins, e pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que deve juntar ICMS e ISS.
A Reforma Tributária é uma demanda antiga no Brasil. A última grande modificação ocorreu no início do governo militar, na década de 1960. Foi prevista, também, dentro do Plano Real, três décadas atrás.
Entre os diversos projetos em tramitação na Câmara dos Deputados, a proposta de unificação dos tributos por meio do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) avançou e compõe o texto que foi para o Senado.
Há muitas reflexões a serem feitas sobre o tema, pois a PEC já definiu alterações que devem impactar de forma positiva ou negativa, a depender do setor e ainda pode sofrer alterações no Senado.
O coordenador do curso de Ciências Econômicas da FAE Centro Universitário, Guilherme Moura, analisa que a Reforma Tributária tem impacto em dois pontos críticos: a complexidade dos impostos e o tamanho excessivo da carga tributária.
“Parece simples quando assumimos que o novo IVA vai substituir ‘apenas’ cinco impostos. Entretanto, os tributos existentes têm uma variedade de regras e exceções, que diferem entre os estados e municípios”.
Moura explica que a premissa é a manutenção da alíquota dos impostos. Por isso, a Reforma não traria tanto impacto neste momento.
Mas, segundo ele, poderá haver mudanças importantes para o consumidor.
“Alguns setores vão pagar mais, enquanto outros serão subsidiados. Produtos de primeira necessidade devem ter a tributação reduzida, privilegiando a população de menor renda. Por outro lado, especialistas apontam que os preços do setor de serviços podem aumentar”, alerta o professor.
A Reforma deve trazer mais justiça tributária, avalia Moura, já que a perspectiva subjacente ao IVA é de que cada empresa pague impostos somente sobre o quanto ela agrega ao produto.
“No caso de uma camiseta, por exemplo, o produtor de algodão vai pagar imposto sobre o que agregou da produção, entre a compra da semente e a venda do algodão. A fábrica de tecidos paga o IVA sobre o valor gerado na transformação do algodão em pano. E, por fim, a confecção paga o tributo sobre o valor agregado ao fim do estágio produtivo. Dessa forma, cada segmento do setor produtivo pagará impostos de acordo com o montante agregado ao produto da economia, ocasionando uma maior justiça tributária”, explica.
Já a coordenadora do curso de Ciências Contábeis da FAE Centro Universitário, Alessandra Bichof, avalia que não devem ocorrer grandes mudanças para a população.
No entanto, ainda assim há vantagens a serem consideradas, explica ela.
“Alguns setores foram citados de forma específica com alíquota reduzida em âmbitos sociais e culturais, bem como a criação do IS, o Imposto Seletivo, para desestimular o consumo de produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Enfim, pautas sociais foram inseridas para dar maior respaldo a setores com voz ativa atualmente”, observa.
Segundo Alessandra, por um lado, o Brasil cria novos formatos de tributação, mas, por outro, continua onerando mais o consumo do que a renda.
“Isso não desonera nosso sistema tributário de forma geral, apenas promete agilidade na forma de tributação”, analisa.
Propostas devem beneficiar população de baixa renda
Com a Reforma há a previsão de um sistema de “cashback”, fazendo com que parte do imposto pago seja devolvido ao consumidor.
A proposta também traz em seu texto a cobrança de uma espécie de “IPVA” para jatinhos e iates, bens de luxo sobre os quais não incidia taxação.
Na pauta também estão alterações no IPTU e no ITCMD. “Essas mudanças também devem afetar o bolso do contribuinte, mas ainda é preciso avaliar o impacto fiscal atribuído”, ressalta Alessandra. “Em suma, a expectativa é que as pessoas com menores salários sejam mais beneficiadas”, completa Guilherme.
Emprego, renda e empresas
O professor Guilherme Moura lembra que a expectativa é de que o setor produtivo da economia seja o principal beneficiário da Reforma Tributária.
Estima-se uma redução do Custo Brasil e a mitigação da disputa tributária entre os estados. A expectativa é o crescimento de novos negócios e o aumento no número de empregos e renda.
“Uma Reforma Tributária que facilita a vida dos empresários e torna mais transparente o sistema de arrecadação dos três níveis de administração pública tende a ser benéfica tanto para o ramo empresarial quanto para as famílias”, analisa o professor de Ciências Econômicas.
Alessandra faz algumas ponderações sobre o impacto da Reforma nos diferentes tipos de empresas: as adequadas ao Simples Nacional terão de se reestruturar para se adequar; os pequenos empreendimentos podem sofrer os impactos da alíquota zero nos itens da cesta básica (o que ainda não pode ser medido).
Já a competitividade será positiva com a tributação simplificada de produtos similares e inovadores.
Outra questão é a disformidade, segundo o professor Moura, na fixação do ICMS nos estados. No sistema atual, muitos têm praticado menores tarifas para atrair a instalação de novas empresas.
Com a reforma, a tributação incidirá no destino do produto, fazendo com que a localização da unidade produtiva não seja relevante no pagamento dos impostos.
“Essa pode ser uma modificação disruptiva na economia, afetando a localização da indústria e do setor de serviços dentro do país”, explica.
No futuro – segundo Alessandra, o período de transição deve levar uma década –, o sistema tributário será ainda mais complexo. Porém, a operacionalização fiscal será muito melhor, com legislação uniforme para todas as cadeias produtivas e um modelo de tributação similar a países considerados de primeiro mundo.
“A tendência é de uma maior segurança jurídica para as empresas, pois diminuirá a quantidade de processos administrativos para recuperação de impostos bem como maior transparência na arrecadação dos tributos”, analisa Alessandra.