O Banco Central (BC) decretou a liquidação extrajudicial do Banco Master S/A e de outras instituições do conglomerado, além de submeter o Banco Master Múltiplo S/A ao Regime de Administração Especial Temporária (RAET).
A decisão ocorre em meio a um cenário de crescente tensão no Sistema Financeiro Nacional (SFN), marcado por tentativas frustradas de fusões, casos de fraudes envolvendo fintechs e denúncias de uso indevido de instituições financeiras por organizações criminosas.
A liquidação do Banco Master ganhou repercussão após a não aprovação da proposta de aquisição parcial da instituição pelo Banco Regional de Brasília (BRB), que havia sido submetida ao BC. O episódio reforçou preocupações sobre a resiliência e a segurança do sistema financeiro.
Arcabouço legal e atualização regulatória
O Conselho Monetário Nacional (CMN), responsável pela formulação de normas, e o Banco Central, encarregado da supervisão, compartilham competências no estabelecimento de regras referentes ao capital mínimo das instituições financeiras.
Essa prerrogativa foi exercida recentemente com a publicação da Resolução Conjunta nº 14, de novembro de 2025, que reformula o cálculo dos limites mínimos de capital e patrimônio líquido das instituições autorizadas a operar pelo BC.
A resolução implementa mudanças significativas ao definir exigências de capital de acordo com as atividades desempenhadas por cada instituição, levando em conta operações de captação, investimentos e o uso intensivo de Tecnologia.
A atualização ocorre após sucessivas fraudes que abalaram o setor, especialmente envolvendo empresas de tecnologia financeira. Até então, as exigências de capital estavam defasadas e não acompanhavam a inflação nem as transformações operacionais do mercado.
Com a nova regra, instituições que utilizam tecnologia intensiva deverão manter capital mínimo entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões, além de valores adicionais conforme o modelo de negócios. Empresas que utilizam o termo “banco” em sua denominação terão de somar R$ 30 milhões ao capital exigido — o que torna operar como banco comercial mais de 300% mais oneroso do que anteriormente.
Regimes de resolução seguem defasados
Apesar dos avanços regulatórios, os mecanismos de resolução de crises no setor financeiro permanecem baseados em legislações antigas, como a Lei 6.024/74 (intervenção e liquidação extrajudicial) e a Lei 2.321/87 (RAET). Em 1997, a Lei 9.447 introduziu a responsabilidade solidária dos controladores, mas o conjunto normativo não acompanha a complexidade atual do mercado nem o avanço das tecnologias financeiras.
O resultado é um sistema que, segundo especialistas, não cumpre plenamente seu propósito: preservar instituições viáveis e encerrar com rapidez as inviáveis. Dados do BC mostram que, entre bancos comerciais, múltiplos e de investimento, foram registrados 111 casos sob regimes de resolução — 20 RAETs, 24 intervenções e 67 liquidações extrajudiciais. A maioria resultou em encerramento das atividades, sendo que apenas uma instituição permanece ativa: o Banco Rural S/A, cuja liquidação foi decretada em 2013 e segue em andamento.
Proteção ao depositante e comparação internacional
Criado em 1995, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) atua como mecanismo de proteção ao depositante, cobrindo valores de até R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, com limite de R$ 1 milhão a cada quatro anos. Desde 1996, o fundo pagou R$ 9,2 bilhões em garantias a 4,2 milhões de clientes em 32 dos 59 casos de resolução.
Em âmbito internacional, o Financial Stability Board (FSB) definiu, em 2011, parâmetros para regimes eficazes de resolução, os chamados “Atributos-Chave”, adotados pelo G-20.
O Brasil se comprometeu a implementá-los, mas o processo permanece incompleto. Em 2019, o Projeto de Lei Complementar nº 281 propôs modernizar os regimes de intervenção e liquidação, prevendo mecanismos como estabilização temporária e uso limitado de recursos públicos. Apesar da urgência aprovada em 2024, o texto ainda não avançou no Congresso.
Descompasso entre regulação e resolução
O setor financeiro vive, assim, uma contradição: enquanto a regulação avança com medidas alinhadas às práticas internacionais, os instrumentos de resolução permanecem ancorados em normas ultrapassadas. A crise envolvendo o Banco Master reacende o debate sobre a necessidade de modernização urgente do arcabouço de resolução bancária no país.























