Os constituintes decidiram e aprovaram logo no artigo 2º da Constituição Federal de 1988 que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário são poderes independentes e harmônicos entre si.
Ocorre que passados apenas 35 anos desde sua entrada em vigor, percebemos que juízes assumiram o protagonismo da sociedade brasileira, mesmo que para isso tenham que ignorar os outros poderes e até mesmo a própria Constituição.
Para se ter uma ideia do impacto das decisões judiciais sobre a realidade do brasileiro médio, que muitas vezes não entende nem mesmo o linguajar típico de nossos Tribunais, serão decididos temas afetos à correção de valores FGTS, desconto no salário para pagamento de sindicato, possibilidade de demissões em massa na Eletrobras e a viabilidade do Orçamento do Governo Federal para 2024.
O protagonismo nesse momento está, como sempre, com os ministros do Supremo Tribunal Federal, que muitas vezes agem de forma isolada.
Mas não são apenas os já famosos ministros do STF que terão papel importante no cenário político-econômico brasileiro, pois também seremos afetados fortemente por decisões do Tribunal Superior do Trabalho, do Superior Tribunal de Justiça e até mesmo pelas instâncias inferiores da Justiça Federal.
Caberá aos Ministros do STF o julgamento da correção do dinheiro do Fundo de Garantia, que utiliza a TR (Taxa Referencial) mais juros de 3% ao ano. A TR rende próxima de zero.
O impacto nas contas públicas é estimado em mais de R$ 660 bilhões, valores esses que sempre são levados em consideração pelos Ministros.
Caberá ainda ao STF finalizar o julgamento que decidiu pela legalidade do chamado “imposto sindical” impostas a todos os empregados de uma categoria, ainda que não sindicalizados.
O TST também deu sua contribuição nesse protagonismo judicial e suspendeu o plano de demissão voluntária (PDV) das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras).
Os sindicatos alegam discrepância entre as condições para empregados e integrantes da diretoria. De forma inusual, também se levou em consideração ofícios do Ministério de Minas e Energia sobre os planos da empresa.
O ministro das Minas e Energia foi ousado e orientou o Tribunal a suspender o PDV, no que foi atendido. A Eletrobras, privatizada em 2022, possui ações em bolsa e o mercado financeiro sempre é impactado com esse tipo de decisão.
Deverá o Poder Judiciário, ainda, decidir se a previsão de arrecadação de R$ 58 bilhões oriundos de disputas sobre o PIS e a COFINS irá se concretizar ou não. Em caso negativo, haverá um rombo fiscal para o Governo Federal.
O assunto decorre da tese do século (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS), o que provocou o envio do Orçamento de 2024 ao Congresso Nacional com essa receita.
Ocorre que as empresas estão ajuizando processos e estão obtendo vitórias em primeira instância da Justiça Federal, com o Governo tentando derrubar essas liminares nos Tribunais Regionais Federais da 2ª e 3ª região.
Como se vê, o brasileiro nem pode ter ideia, mas seu cotidiano será fortemente afetado por todas essas decisões vindas de juízes, desembargadores e ministros, muitas vezes suplantando competências de outros poderes e ignorando princípios jurídicos para atender interesses econômicos do Governo Federal.
Eduardo Bonates é advogado especialista em Contencioso Tributário e Zona Franca de Manaus e sócio do escritório Almeida, Barretto e Bonates Advogados.