Justiça do Trabalho do Espírito Santo considera motorista de aplicativo “empregado”

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A 6ª Vara do Trabalho de Vitória, no Espírito Santo, reconheceu vínculo empregatício em uma ação de um motorista contra um aplicativo de transporte. O juiz considerou que a relação entre as partes era uma relação empregatícia, porque preenchia todos os requisitos (subordinação, onerosidade, não eventualidade e pessoalidade).

O Autor da ação, em seu depoimento, disse que a escolha de dias e horários de trabalho é feita pelo motorista, mas que o aplicativo, por meio de promoções, induz a continuidade da jornada de trabalho. Alegou, ainda, que recebia advertências sobre a forma de dirigir e que tinha que reportar tudo ao aplicativo, caso contrário não conseguia fazer nada e que chegou a ser excluído da plataforma por ter feito muitos cancelamentos de corridas.

“Com base neste depoimento, a Justiça do Trabalho entendeu que o aplicativo agia como um empregador, que pune o trabalho ou serviço mal executado, orientando a forma de execução do trabalho, determinando que houvesse prestação contínua pelo mesmo motorista”, explica o advogado Rodrigo Siqueira Assis de Sousa, do escritório FASS – Fonseca Assis & Associados, de direito empresarial e digital.

Diversos aplicativos de corrida são utilizados pela população, como uma alternativa ao péssimo serviço de transporte público no Brasil. A discussão sobre haver ou não relação de emprego entre aplicativos e motoristas é uma das matérias de maior repercussão na Justiça do Trabalho nos últimos tempos. Isso porque os requisitos são muito subjetivos, como, por exemplo, o que pode ser considerado como “não eventualidade” ou “subordinação”. “A linha é tênue entre a diferenciação dos contratos de emprego (CLT) e de prestação de serviços, pois muitos dos requisitos são plenamente aplicáveis a ambos”, comenta Sousa.

O principal ponto utilizado pela Justiça laboral para caracterização de vínculo empregatício é o requisito da subordinação, que sua interpretação é extremamente ampliada.

Esclarece Sousa, que “sustentar que há subordinação na cobrança por uma boa execução de serviço ou apenas o cumprimento das regras básicas, geraria vínculo em todas as prestações de serviço possíveis, haja vista que este tipo de cobrança ocorre em todas as relações humanas”.

Portanto, a subordinação, aos olhos de Sousa, é quando há uma relação hierárquica de mando, onde o subordinado não possui qualquer grau de discricionaridade.

Em outras palavras, há subordinação quando um manda e o outro obedece. Mas e a relação motorista-aplicativo, como funciona?

• O motorista realiza um cadastro e envia a documentação;

• O aplicativo avalia a documentação e, se tudo estiver de acordo com a política da empresa, aceita o cadastro do motorista na sua plataforma;

• A partir daí, o aplicativo conecta usuários finais que precisam de transporte aos motoristas que se cadastraram e cobra uma taxa (dos motoristas) por esta captação de clientes.

Não há exigência de horários, número mínimo de viagens, e nem que o motorista trabalhe todos os dias da semana. O aplicativo também não pode obrigar o motorista a dirigir em determinada região ou escolher certas rotas que são mais demandadas. “O motivo não é só que as plataformas não podem obrigar o motorista a trabalhar, na verdade, elas nem conseguem, pois ele simplesmente pode desligar o celular por dias, meses, ou até para sempre, sem que o aplicativo possa fazer nada, não havendo qualquer tipo de punição”, detalha o advogado do FASS. Em contrapartida, se o motorista atender mal aos usuários e for mal avaliado, ou cancelar muitas corridas, ele pode ser descadastrado .

É importante deixar claro que o motorista não tem surpresas depois que é cadastrado pelo aplicativo. Todas as regras são apresentadas antes, nos termos de uso do aplicativo, e ele só pode começar se estiver de acordo. Os taxistas, por exemplo, também são contratados por meio de aplicativos que cobram taxas e nem por isso são considerados empregados dos aplicativos.

Neste caso capixaba, em específico, a Justiça do Trabalho considerou como fator os “incentivos” para que o motorista trabalhasse mais horas e fizesse um maior número de viagens. Isso foi considerado como subordinação, como se o aplicativo estivesse “mandando indiretamente” que o motorista trabalhasse mais. “Mas não existe nenhum empregado que pode escolher se, quando e onde quer trabalhar, sem ter de dar satisfação ao empregado, o que torna esta decisão judicial muito questionável”, argumenta Sousa.

Segundo ele, o escritório FASS elaborou um parecer para uma startup em 2017, no qual considerou a posição do Ministério do Trabalho, suas jurimetrias e estatísticas, bem como o comportamento padrão dos juízes, concluindo que a startup deveria tomar alguns cuidados para reduzir os riscos trabalhistas, evitando justamente punições ou incentivos para seus entregadores e motoristas-parceiros. As sugestões de cautela não foram dadas porque ficou entendido que isso configuraria a relação de emprego, mas porque já existiam suspeitas de que a Justiça do Trabalho poderia distorcer o requisito “subordinação”, e tomar decisões equivocadas.

Uma grande parte da população utiliza os aplicativos de transporte, que vieram para resolver uma dor da população: a péssima qualidade dos transportes públicos e os serviços de baixa qualidade (em regra) prestados por taxistas no passado, que até então estavam blindados de qualquer concorrência. Basta “dar um google” para perceber que a maioria das pesquisas mostra que a população gosta, utiliza e defende os aplicativos, muitas vezes até o próprio motorista, vendo-os como uma evolução no transporte particular em substituição ao transporte público.

Além disso, os aplicativos aquecem a economia e dão oportunidade a milhares de desempregados uma alternativa para terem uma renda e melhorarem a qualidade de vida de suas famílias. Por outro lado, a maioria dos entregadores e motoristas não querem ser empregados .

De acordo com o site da Uber, hoje já existem mais de 1 milhão de motoristas e entregadores cadastrados . Dessa forma, se a decisão da Justiça do Trabalho for mantida e começar a ser reproduzida por outros juízes, as consequências serão muito ruins para as empresas de aplicativos de transportes, mas também para a população que utiliza os serviços e os parceiros que os oferecem.

“Decisões como essa que, em tese, protegem um ou outro trabalhador que se sentiu empregado – mesmo não tendo qualquer surpresa desde a contratação -, no fim das contas, acabam prejudicando toda uma categoria que vê nos aplicativos uma forma de acréscimo da renda”, conclui Sousa.

A FASS

Fundada há 17 anos em Vitória, no Espírito Santo, a Fass – Fonseca Assis Advogados é um escritório de advocacia empresarial, especializado nas áreas de Comércio Exterior, Tributário, Trabalhista, Digital e Tecnológico, com portfólio completo de serviços jurídicos.

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