Cirurgias eletivas são retomadas e causam impacto em mercados da saúde

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Quem aguarda por uma cirurgia eletiva sabe o quanto ela pode impactar na sua qualidade de vida. O aposentado José Ramalheira Lopes, de 55 anos, é um desses pacientes. Ele sofre há cinco anos com um diagnóstico que aponta redução da textura óssea do seu quadril esquerdo. O caso dele piora a cada dia. Por conta desse “desgaste”, ele tem uma diferença de altura de uma perna para outra. Por isso, fica limitado em ações simples do dia a dia, como sentar, pegar um ônibus ou brincar com os netos. “A dor é bem aguda e atrapalha os meus movimentos. Fica difícil realizar qualquer atividade. A cirurgia para nivelar essa alteração ia fazer uma diferença enorme na minha vida”, desabafa José.

Ele é um dos milhares de brasileiros que aguardam por uma cirurgia eletiva, aquelas consideradas não emergenciais.

A pandemia, gerada pelo novo coronavírus, adiou ainda mais os planos de quem precisava realizar este tipo de procedimento, que havia sido suspenso em abril deste ano. Foi nesse mês que houve uma queda de até 90% de exames e cirurgias eletivas, segundo as entidades que representam os hospitais privados e filantrópicos do Brasil.

Em junho, esse cenário começou a mudar no Estado do Rio de Janeiro e as cirurgias eletivas estão sendo gradativamente retomadas.

Segundo a Secretaria de Estado de Saúde do RJ, o que contribuiu para essa volta foi a queda na taxa de ocupação de leitos de UTI dos hospitais, que estavam sendo destinados apenas para pacientes com Covid-19 ou de casos de urgência e emergência. Por isso, agora há mais leitos para atender os pacientes com todos tipos de patologias. O que se discute nesse momento é como vem sendo essa retomada e como ela impacta, além dos pacientes, os mercados de fornecedores de insumos e serviços para tais procedimentos.

Cenário atual das cirurgias eletivas

Segundo o diretor da Associação de Hospitais do Estado do Rio de Janeiro (AHERJ), Graccho Alvim, houve uma queda no requerimento destes procedimentos. “Apesar da sua retomada, nós temos alguns médicos que ainda não retornaram ao atendimento de ambulatório e consultório. E, ao mesmo tempo, temos uma população que ainda está muito temerosa em fazer qualquer cirurgia ou procedimento, principalmente porque a taxa de contaminação do Covid 19 ainda é muito alta”, explica.

Na visão do diretor, esse comportamento gera várias consequências como, por exemplo, o acúmulo de diagnósticos e doenças que podem evoluir sem o devido atendimento. Ele ainda comenta que talvez esse fator justifique um estudo feito pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que apontou que o número de mortes em casa dobrou durante os meses de abril e maio. “Além disso, exames como broncoscopia, por exemplo, tiveram queda muito grande de procura nesse período, e são exames que podem revelar diagnósticos que deixaram de ser feitos e trabalhados, como o câncer e tuberculose, por exemplo”, avalia.

Marcelo Dibo, médico e Diretor Executivo do Hospital Badim, localizado no município do Rio de Janeiro, comenta que por lá a situação também é essa: demanda ainda reprimida e movimento de 30% da capacidade do hospital.

Como medidas de segurança para quem escolheu realizar a cirurgia eletiva, ele fala das ações que vêm sendo tomadas, que vão desde rotas de segurança dentro do hospital, como a realização de testes rápidos nos pacientes cirúrgicos, seus acompanhantes e em toda a equipe cirúrgica. “Definimos também setores de internação e CTI específicos para pacientes não-Covid-19 e dedicamos equipes médica e de enfermagem exclusivas à assistência pré e pós-operatória para esses pacientes. Também separamos um elevador para uso apenas de quem passará por cirurgia eletiva e ampliamos a higienização do centro cirúrgico e do andar onde esse setor está localizado”, explica.

Mercado fornecedor

Outro impacto da paralisação e da volta das cirurgias eletivas foi perante o mercado de empresas que fornecem produtos e serviços neste setor.

O diretor da AHERJ, Graccho Alvim, diz que segmentos como os de equipamentos de segurança, aumentou a demanda em até 300%, pois houve uma grande necessidade mundial. Mas, para quem fornece para cirurgias eletivas, como as de OPME, por exemplo, a queda da procura foi brutal. “Ninguém procurou mais, os preços caíram e a demanda por estes produtos e serviços também caiu demais. Esse mercado vai voltar aos poucos, retornando de forma gradual. Vai depender de como teremos continuidade de contaminação, o que tornaria a situação mais caótica, tanto para a população, quanto dos hospitais, que não conseguem produzir para subsistir tratando apenas pacientes com o coronavírus”, ressalta.

Nessa perspectiva, no segmento que fornece materiais para cirurgias eletivas, organizações que não contavam com sólida estrutura empresarial ou processos rigorosos, sofrem ainda mais os impactos, como por exemplo a possível perda de funcionários estratégicos e a falta de material. Contudo, as organizações que vinham investindo em suas estruturas e aprimorando seus processos, vivem uma outra realidade.

Para Edson Roberto Aguiar, Diretor Executivo da Porto Surgical, distribuidora de produtos médicos no atendimento de procedimentos cirúrgicos de alta complexidade, o cenário na empresa surpreende positivamente. “Ainda não temos o mesmo volume de demanda que tínhamos antes. Mas, se analisarmos os indicadores nesse período, estamos até além do que prevíamos e em uma velocidade de retomada maior do que esperávamos. Parte disso pode se justificar pelo fato de que não tivemos retrocessos, não perdemos talentos”, aponta Edson.

Em uma outra análise, ele diz que em situações imprevisíveis como a pandemia, para que uma empresa possa passar por este momento em segurança, é vital que o investimento tenha sido feito ao longo de anos. “Acreditamos que estamos passando de forma mais tranquila por este momento porque desde sempre estamos construindo um legado, investindo em processos, sistemas, qualidade, compliance e integração dos nossos colaboradores. Tudo isso fez com que, apesar das circunstâncias, conseguíssemos passar com poucos arranhões e pudéssemos manter salários, carreiras, planos de saúde e baixo índice de contaminação entre os funcionários, mesmo trabalhando para atender as poucas cirurgias que surgiram no auge da crise”, afirma.

Outro ponto são as demandas desse mercado para o futuro. Ainda segundo o diretor da AHERJ, Graccho Alvim, as solicitações por cirurgias não emergenciais podem aumentar de uma hora para outra. “Com a pandemia, as doenças que não foram investigadas e tratadas, vão ter em algum momento um fluxo maior de procura por atendimentos, internações e cirurgias eletivas”, diz. Essas previsões vão exigir do mercado ainda mais eficácia e qualidade.

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