A necessidade de maior segurança fiscal, regulatória e jurídica foi o principal ponto destacado por executivos e especialistas do setor de energia durante o Seminário de Gás Natural 2025, promovido pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) nesta quinta-feira (15), no Rio de Janeiro. Segundo participantes, a falta de previsibilidade e a fragmentação regulatória entre União e estados têm sido obstáculos à ampliação dos investimentos no setor.
Durante o painel “CEO Talks”, Rodrigo Soares, CEO da Shell Energy Brasil, ressaltou que a empresa, com 102 anos de atuação no país, é atualmente o segundo maior produtor de gás natural do Brasil.
Para ele, a transição de um modelo monopolista para um mercado com múltiplos agentes trouxe avanços, como maior flexibilidade contratual, mas a regulação ainda precisa evoluir.
“É necessário harmonizar a regulação entre os estados e a federação. A indústria precisa ter certeza de que poderá cumprir os compromissos firmados com seus acionistas”, afirmou Soares.
Ele citou o investimento no campo Gato do Mato, na Bacia de Santos, como exemplo do compromisso da Shell com o país e defendeu a realização do leilão de capacidade, inicialmente previsto para junho, mas adiado pelo Ministério de Minas e Energia (MME). “Esse leilão é fundamental para reduzir a volatilidade do mercado”, disse.
O executivo também mencionou o interesse da empresa em integrar o biometano ao portfólio de energéticos comercializados no país.
Infraestrutura e conexão entre oferta e demanda
No painel “Conectando a oferta com a demanda”, representantes da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Repsol Sinopec e Nova Transportadora do Sudeste (NTS) discutiram os riscos à infraestrutura. Heloisa Borges, diretora da EPE, afirmou que a ausência de dados concretos e alinhados às necessidades da sociedade compromete a atratividade dos investimentos.
Ela anunciou que o Plano Nacional Integrado das Infraestruturas de Gás Natural e Biometano (PNIIGB) passará por novas consultas até dezembro de 2025.
Andrés Sannazzaro, gerente de comercialização de gás da Repsol Sinopec, alertou para os riscos jurídicos e de capital, especialmente no segmento de exploração e produção (upstream). A empresa já investiu cerca de US$ 6,7 bilhões no setor brasileiro de petróleo e gás, incluindo o projeto Raia, seu maior aporte no país.
Erick Portela Pettendorfer, CEO da NTS, informou que a empresa já investiu R$ 1,5 bilhão no Brasil e pretende ampliar a integração da malha de transporte, incluindo gás vindo da Bolívia e do Nordeste. Ele destacou que o transporte é “a solução” para conectar fontes de gás aos pontos de distribuição.
Juliana Rodrigues, especialista da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE), apontou a falta de transparência no acesso às informações sobre a infraestrutura e defendeu um planejamento mais criterioso, principalmente diante das incertezas sobre a demanda de biometano e a continuidade das térmicas conectadas ao sistema de transporte.
Regulação como pilar da segurança jurídica
No painel sobre os desafios regulatórios do transporte de gás, a diretora da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Symone Araújo, reforçou que a regulação deve atuar como vetor de segurança jurídica e não como fonte de riscos.
Segundo ela, o transporte de gás natural, por ser monopólio natural, exige um tratamento regulatório específico.
Adrianno Lorenzon, vice-presidente do Conselho de Usuários (CdU), ressaltou o papel da entidade na interlocução com a ANP em temas como revisão tarifária, contratos e investimentos. Já Helder Ferraz, diretor da NTS, defendeu maior transparência e a revisão da Resolução 15 da ANP, que trata do cálculo das tarifas de transporte.
Para Ovídio Quintana, diretor da TAG, a expansão da infraestrutura é essencial para reduzir custos e preços. “Sempre esbarramos na questão do preço. Sem infraestrutura, isso não se resolve”, afirmou.
Tributação e reforma fiscal
A tributação do gás natural também foi tema de debate. Rodrigo Novo, gerente tributário da Origem Energia, criticou o regime monofásico proposto, que, segundo ele, pode elevar custos e inviabilizar o gás como vetor da transição energética.
Um estudo da FGV Energia apontou que cerca de R$ 9 bilhões em créditos tributários podem se acumular, recursos que poderiam ser revertidos em investimentos no setor.
Frederico Pereira, diretor financeiro da Galp no Brasil, citou desafios decorrentes da reforma tributária, como a harmonização entre ICMS e tributos federais, além da definição de alíquotas. “O tratamento atual pode tornar o ICMS um custo e afetar a viabilidade dos projetos”, afirmou.
Priscila Torres, gerente tributária da TAG e da ATGás, destacou a importância da Lei Complementar 214/2025, que, segundo ela, está mais alinhada com o novo marco do gás aprovado em 2021. A lei estabelece diretrizes para a tributação do setor até o período de transição previsto para 2032.