O recente anúncio de aumento no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) gerou forte reação no mercado financeiro, alimentando preocupações sobre o ambiente institucional e a previsibilidade regulatória no país.
Em nova decisão com forte impacto fiscal e jurídico, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, validou parte do decreto presidencial que aumentou a alíquota do IOF sobre operações financeiras. Com isso, a medida permite que o governo Lula garanta a arrecadação estimada de R$ 31,3 bilhões até 2026, sendo R$ 450 milhões ainda neste ano. A única exceção foi a tributação sobre operações de risco sacado, considerada inconstitucional por criar uma nova hipótese de incidência sem respaldo legal.
A decisão tem efeito retroativo a 11 de junho de 2025, data de publicação do Decreto 12.499/2025. Sendo assim, o aumento do IOF permanece válido desde essa data, enquanto a cobrança sobre risco sacado é considerada nula desde sua origem, como se nunca tivesse existido no ordenamento jurídico. A medida, vista por analistas como parte de uma estratégia de fortalecimento da arrecadação federal, também reacendeu o debate sobre uma possível aliança entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o governo federal na condução de pautas econômicas sensíveis.
A elevação da alíquota do IOF, especialmente em operações de crédito e movimentações de capital, já começa a impactar o humor de investidores e pode resultar em fuga de recursos financeiros para o exterior, segundo especialistas em macroeconomia. A medida é interpretada por parte do setor privado como um sinal de maior intervencionismo e insegurança jurídica, num momento em que o país ainda tenta consolidar sua recuperação econômica.
Para a tributarista Mary Elbe Queiroz, a decisão levanta preocupações jurídicas relevantes. “A decisão de Moraes acatou o decreto presidencial, com base na jurisprudência do STF, e ainda deu um sinal ao Congresso ao reconhecer que, em casos como o do risco sacado, seria cabível a suspensão. O problema é que o IOF, que deveria ter função regulatória, vem sendo utilizado com viés arrecadatório. Sua majoração por decreto, com efeitos imediatos e sem aprovação prévia do Congresso, fere os princípios da legalidade e da anterioridade tributária previstos na Constituição. Essa flexibilização abre um precedente preocupante, pois permite ao Executivo alterar tributos de forma unilateral, enfraquecendo a segurança jurídica e o equilíbrio entre os Poderes”, afirmou.
A especialista chama atenção ainda para os efeitos retroativos da decisão, que exigem o recolhimento do IOF desde a data do decreto, inclusive no período em que a cobrança havia sido suspensa pelo Congresso. “Com isso, instituições que não retiveram o imposto, como bancos , podem agora ser responsabilizadas pelo pagamento com recursos próprios, o que gera impacto direto no fluxo de caixa e pode acarretar cobranças com juros e multa, ampliando de forma significativa o peso financeiro da medida”, alerta.

A articulação entre o Executivo e o STF para validar juridicamente a medida — contornando resistências no Congresso Nacional — foi interpretada por analistas políticos como mais um indicativo da cooperação estratégica entre os poderes. Em meses anteriores, decisões em temas fiscais e orçamentários também contaram com apoio do Supremo, reforçando essa percepção.
A expectativa agora é sobre os efeitos secundários da alta do IOF sobre o câmbio, o consumo interno e o comportamento dos investidores. Em paralelo, cresce a pressão por uma maior previsibilidade tributária e institucional, especialmente diante do cenário global de juros elevados e capital mais seletivo.
Mercado reage
A decisão do Supremo gerou forte reação no mercado de crédito estruturado, especialmente entre gestores de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), que agora enfrentam um cenário de maior incerteza tributária.“A decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, que restabelece a cobrança de IOF sobre investimentos em fundos que fomentam o mercado de crédito brasileiro, traz uma sinalização clara: o Executivo tem respaldo para tributar via decreto. No entanto, o efeito colateral é imediato, o mercado perde previsibilidade.Estamos falando de um segmento que vinha sendo responsável por irrigar crédito para milhares de pequenas e médias empresas por meio de FIDCs”, explica Leandro Turaça, sócio gestor da Ouro Preto Investimento.

No segmento de FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios), que vinha desempenhando papel essencial no financiamento de pequenas e médias empresas, o impacto é direto. A antecipação de recebíveis, alvo da cobrança restabelecida, é um dos pilares das operações estruturadas que dão agilidade e previsibilidade ao crédito fora do sistema bancário.
Segundo Leandro Turaça, com essa mudança, o mercado de crédito estruturado vai precisar se reinventar. Não apenas do ponto de vista jurídico, mas operacional e estratégico. Será necessário repensar o desenho das estruturas, incorporar o risco tributário nas projeções e, em muitos casos, recalibrar a rentabilidade das operações para preservar a atratividade. A avaliação entre operadores e investidores é clara: o episódio reforça a necessidade de estabilidade regulatória, principalmente num ambiente em que o mercado privado tem buscado assumir protagonismo na oferta de crédito. A sinalização do STF de que tributos podem ser alterados por decreto, sem debate parlamentar, amplia o grau de incerteza, e com ele, o custo do capital.